Wednesday, March 22, 2006

"Óh Jaime paga o que deves"

Ontem alguem de quem não gosto particularmente (Paulo Portas) disse uma coisa com a qual concordo em absoluto. Por momentos até senti medo de mim mesmo :-)

Dizia ele que juntamente com a declaracao universal dos direitos do homem deveria vir uma eclaracao universal dos deveres do homem.

E é com isto que concordo, ora vejamos, o programa dele tem 1 hora e esta frase demorou 10 segundos a dizer e 20 segundos a desenvolver. Pelas minhas contas concordei com 0,83% do que ele disse no programa, assim já parece menos assustador.

Mas pensando na questão dos deveres do homem. É um facto que a declaração dos direitos do homem foi um passo importante para um mundo que se quer mais humanista, mais preocupado com o bem estar das pessoas e os seus direitos fundamentais. Mas uma das consequências desta onda humanista do séc. XX tem sido o esquecimento em relação ao outro lado, o lado dos deveres.

Eu tenho o direito à liberdade de expressão, mas também tenho o dever do respeito pelas outras culturas e pelas outras religiões. E eu, que concordo com a publicação dos cartoons, seria sem dúvida mais ponderado na forma.

Tenho o direito ao trabalho, mas tenho o dever de respeitar o bem comum. Na maior parte dos conflitos sociais de hoje que têm o trabalho como pano de fundo, há sempre uma ideia de que de um lado está um empresário sem escrupulos e do outro está um trabalhador cansado e explorado. Não é bem assim, muitas das medidas de flexibilização da legislação laboral visam a criação de mais emprego.

Mas a troca de emprego será mais frequente? sim! A exigência no local de trabalho será maior? sim! A produtividade será maior? sim!

Ou seja, os direitos de uns serão assegurados à custa dos direitos de outros. Mas os "uns" aqui são mais que os "outros" e além disso encaixar-se-ão num sistema que produz mais e quando produz produz para todos, para uns e para outros.

Já se viu o que economias de direitos estanques ao trabalho produzem colectivamente. E aquilo que se viu não é bom. Toda a gente tem trabalho, sim! Mas ganham mal individualmente e produzem pouco colectivamente, tornam-se sociedades dependentes das importações para bens mais inovadores e assim gastam grande parte da riqueza interna. Temos muitos exemplos no leste.

Mas esta questão dos direitos vs deveres vai muito mais além da legislação do trabalho. A face que mais me choca é esta ideia mítica do estado serem "eles". E o estado, ou seja, eles, ter de tomar conta de nós. Sim, porque nós temos direitos.

Acho que nós (o estado) temos de tomar conta uns dos outros porque devemos viver numa sociedade solidária. Mas temos de ter a noção de que somos "Nós".

Ainda ontem vi em Portugal a manifestação dos agricultores, um deles de auricular sem fios na orelha dizia para a camara "Óh Jaime paga o que deves".

"Óh Jaime paga o que deves"... Jaime é o ministro da agricultura. O dever do Jaime é pagar, o direito do agricultor do auricular é receber infinitamente fundos europeus para que possa fazer o seu negócio sem ter de pensar nessa coisa complicada que se chama mercado.

No mesmo dia, ontem, a SIC passou uma peça no telejornal sobre um casal português da cidade que resolveu ir viver para o campo e sem subsidios montou um negócio de ervas aromáticas. Ele diz que já não tem sábados há 3 anos porque aos sábados há os mercados e as feiras (sacana do mercado). Mas diz isto contente pois logo a seguir revela que não podia estar mais feliz, montaram o seu negócio sem subsidios e realizaram o seu sonho de viver no campo.

Ainda bem que estes jovens empreendedores não tinham o contacto do Jaime.

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